O Grêmio volta ao passado | Crédito: Bruno Tedesco
Era 30 de agosto de 1995 em Medellín, na Colômbia. Aristizábal havia feito o primeiro gol do Nacional contra o Grêmio de Felipão, que mantinha o limite da vantagem adquirida com a vitória por 3 x 1, em Porto Alegre. Dinho, de pênalti, a 5 minutos do fim, encerrou o sofrimento. O Tricolor era campeão da América. Nos 20 anos que se seguiram, o sonho gremista era apoderar-se da máquina que Marty McFly usou para viajar no tempo em 1985, no filme De Volta para o Futuro. Por coincidência, o segundo episódio da trama o transportava para 2015.
E aqui estamos. A máquina do tempo gremista transporta o torcedor, nostálgico de títulos, duas décadas para o passado. O Olímpico ainda existe, mas é na novíssima Arena que o time manda seus jogos. A esperança do reencontro com a época de ouro está personificada em um personagem, o operador da máquina que pode devolver o Grêmio à sua época de ouro.
Sim, é Felipão. O reencontro promovido no ano passado, em meio ao Brasileirão, foi um acerto de contas entre duas histórias que pediam para ser reescritas. Só uma entidade no mundo não havia condenado o treinador pelo 7 x 1 da Alemanha em cima da seleção. E foi a torcida do Grêmio. Enquanto o mundo de Luiz Felipe Scolari parecia se desconstruir gol a gol no Mineirão, Fábio Koff começava a pavimentar o retorno do mito gremista ao clube com um mantra: Felipão precisa do Grêmio, o Grêmio precisa de Felipão.
Felipão entre Carlos Miguel e Paulo Nunes, chefiava o time campeão da América em 1995 | Crédito: Edison Vara
Oito dias depois da eliminação do Brasil da Copa do Mundo, em 8 de julho, o então presidente gremista telefonou para Felipão. Precisava resgatar a temporada, o que não ocorrera com a manutenção de Enderson Moreira. Juntos, Koff e Scolari levaram o clube a conquistar a Copa do Brasil, o Brasileirão e a Libertadores. Por pouco não venceram também o Mundial. Naquele tempo, meados dos anos 90, o Grêmio mandava no país, era temido, seu torcedor estava feliz, e o clube ganhou dois Gauchões, chegando a apelidá-lo de “Cafezinho” (porque vinha depois dos muitos banquetes nacionais e continentais) e de “Ruralito”, ao bater o arquirrival escalando o time B — este, por sua vez, alcunhado pelos gremistas de Banguzinho. Koff e Felipão eram os personagens mais famosos do Rio Grande.
Os anos foram passando e os títulos, rareando. Mas Felipão jamais perdeu a aura de herói gremista. Ao contrário: sua lenda foi crescendo, de geração em geração. “Desde que voltei para o Grêmio, meu objetivo era trazer o Felipão de volta. Que possamos devolver ao Grêmio o que é do Grêmio, a alegria que está faltando aos gremistas”, discursou Koff, em tom solene e realista, ao apresentar o técnico em 30 de julho, ainda com o Brasil sob o choque da goleada e da superioridade da Alemanha, que conquistou o tetracampeonato mundial no Maracaña.
No Sul, Felipão é Felipão. Nada de Scolari ou de Luiz Felipe Scolari. É o gringo (gíria gaúcha para os descendentes de italianos) que saiu de Caxias do Sul para conquistar o mundo. Foi apresentado na Arena, sob a ovação de 5.000 torcedores. “Se eu pensei, ou fui induzido a pensar em voltar ao futebol logo depois de um trabalho, o único time que eu pensaria seria o Grêmio. Eu também preciso de um abraço, de um carinho, de pessoas que me ajudem. O Grêmio é esse time. Todos sabem que aqui é minha casa. O único time a que eu voltaria seria o Grêmio”, derreteu-se Felipão, ao ser apresentado e receber a camisa tricolor, com o número 1 às costas.
Reproduzir uma das melhores formações do Grêmio em todos os tempos não será fácil até mesmo para o histórico treinador.
Afinal, há poucos recursos em caixa para contratações, assim como nos anos 1990. Porém, o futebol está bem mais caro. “O clube busca dinheiro, investidores, mas tudo está mais difícil hoje. O jogador que aceitar um contrato com o Grêmio virá conhecendo a realidade do clube. O Grêmio não pode ficar muito para trás com relação aos demais clubes do Brasil”, afirma Dinho, camisa 5 em 1995.
O fim do sonho da América em 2015, com a perspectiva do deficitário Estadual mais uma insossa fase inicial da Copa do Brasil no primeiro semestre, fzeram com que o Grêmio enfasse o pé no freio. A folha foi reduzida de 7,5 milhões de reais para 4 milhões. Em 2014, houve difculdades para manter em dia premiações e contratos de imagem dos atletas. As (poucas) contratações para 2015 não foram muito animadoras: o meia Douglas, ex-Vasco, bancado por Felipão, e o polivalente Marcelo Oliveira, que fez fraca campanha com o Palmeiras em 2014 — mais o retorno do atacante Marcelo Moreno, que já deixou o clube. Dudu, Fernandinho, Pará, Bressan e Zé Roberto deixaram a Arena. A solução está na base do clube.
“Estamos resgatando uma cultura do Grêmio”, diz o presidente Romildo Bolzan Júnior. O dirigente entende que os períodos são diferentes. Apenas Felipão faz a ponte entre eles. “São jogadores e épocas distintas. Nossa situação financeira é bem pior do que nos anos 90. Lá, ao menos tínhamos receitas com o Olímpico, que não temos mais”, afirma, destacando as dificuldades financeiras desde a mudança para a Arena, um negócio que ainda não rendeu o esperado.
Antes e depois | Crédito: Divulgação
E o resgate dessa tradição, da cultura e do espírito de clube, está, sim, no avalista Felipão. É ele quem tem a missão de devolver para o time principal o grande patrimônio gremista — os garotos formados na Azenha. “É a nossa história. Formamos nossos jogadores. Jogadores que sobem identifcados com o Grêmio. Foi assim também nos anos 90”, diz o presidente.
Para Romildo, Luiz Felipe Scolari é quem dará peso ao novo projeto: “Ele tem estatura técnica e de desempenho, que avaliza qualquer projeto. E dá segurança para quem está nele. Imagina um guri da base olhando para o Felipão e escutando os ensinamentos dele? Sempre fará o que o técnico pede, porque aquele homem tem uma história gremista e campeã”, afirma o dirigente.
Antes e depois | Crédito: Divulgação
Luiz Carlos Silveira Martins, o Cacalo, vice de futebol do Grêmio de Felipão nos anos 90, observa que a mística é para o inconsciente coletivo da torcida. “Não houve mística na época, mas uma avaliação correta de bons jogadores. De cara, vencemos o Gauchão de 1993, fomos vice da Copa do Brasil daquele ano, mas conseguimos aliviar um pouco a pressão e ganhamos tempo para remontar o time para 1994, quando conquistamos a Copa do Brasil. O problema é que, hoje, o clube vem acumulando maus resultados e a pressão só cresce.”
Cacalo recorda que o pulo para 1995 começou em meados do ano anterior, com a análise de reforços. Dinho e Goiano eram os “veteranos” da lista, bem como o paraguaio Rivarola. Do Rio, vieram os “descartados” Magno e Paulo Nunes, ambos do Flamengo, e Jardel, do Vasco. O maior investimento (valor que não chega perto do que se paga hoje para contratar um juvenil) foi no lateral-direito do Cerro Porteño.
“O Grêmio daquele período também não tinha dinheiro para investir. Porém, os valores da época não eram proibitivos. No fim, Arce foi nosso maior investimento. Também era o mais desconhecido. Caíram de pau na contratação”, conta Cacalo, com um sorriso irônico ao se referir ao sucesso do paraguaio.
Curiosamente, é na penúria que a mitologia de Scolari ganha corpo. A comparação com os anos 90 é inevitável. Naquele tempo, um Grêmio com poucos recursos montou uma equipe formidável, a partir de jovens da base (Danrlei, Carlos Miguel, Arílson, Roger e Emerson). “Se há alguém que pode clonar aquela equipe, certamente é Felipão”, afirma Roger, o lateral-esquerdo dos vitoriosos anos 90. “A ideia de jogo de Felipão permanece a mesma: defesa forte, meio-campo sólido e ataque veloz. De preferência, com um homem de área.”
No tricolor gaúcho, histórico de Felipão é e aposto em promessas, como Luan, meia de 22 anos | Crédito: Edison Vara
Na nova composição da direção tricolor, Fábio Koff será o vice de futebol. Permanecerá com uma ligação umbilical com Felipão, como há 20 anos, ainda que antes ele fosse o presidente. Para a harmonia nos bastidores do Grêmio, é bom que a liga da dupla esteja fortalecida uma vez mais.
O Grêmio de hoje ainda é uma obra em execução, mas há convicções de que é possível repetir a história ou voltar no tempo. Mais do que nunca, o Grêmio precisa de Felipão, assim como Felipão precisa do Grêmio para retomar o curso vitorioso de sua carreira, abalada no último Mundial. Quem sabe, a exemplo de Marty McFly, a fantasiosa máquina tricolor volte 20 anos no tempo para direcionar o curso vitorioso do clube, consagrado na era do Olímpico, rumo à Arena.
AS FAMÍLIAS DE SCOLARI
Comparando os perfis da maioria das equipes de Felipão, a primeira característica que se destaca é a do setor ofensivo. Em todos os times — mesmo quando atua com cinco jogadores no meio-campo, como no Grêmio de 2014 —, ele opta por um atacante de velocidade e um centroavante de área.
Grêmio de 1995
No papel, era um 4-4-2. No campo, no entanto, o time se comportava no mais atual 4-2-3-1, com dois zagueiros (Rivarola e Adílson), dois laterais que apoiavam (Arce e Roger), dois volantes alinhados e disciplinados na marcação (Dinho e Goiano) com Arílson na articulação.
Carlos Miguel aparecia no meio, mas caía mais pelo lado esquerdo do ataque, como um ponta. Paulo Nunes voltava para recompor o meio pela direita e protegia as descidas de Arce. Jardel era o único homem fixo no ataque. As linhas na marcação comumente se adiantavam.
Grêmio de 2015
Não abre mão de ter um legítimo camisa 9. Por isso, com as saídas de Barcos e Marcelo Moreno, o Grêmio vive uma crise no setor. No meio-campo, normalmente utiliza dois volantes na proteção da defesa e dois meias mais soltos. Nas laterais, os times de
Felipão costumam ter um lateral mais ofensivo do que o outro, e os dois raramente sobem ao ataque ao mesmo tempo.
Seleção de 2014
Observando a seleção de 2014, percebe-se que o técnico não levou em conta os padrões consagrados no Grêmio para montar o time da Copa do Mundo. O Brasil teve um dos volantes muito ofensivo, que não protegia a defesa, como Paulinho, assim como os dois laterais. Do meio para a frente, três atacantes, com um deles, Hulk, ocasionalmente desempenhando também a função de meia.
E ESPERANÇA VEM DA AZENHA
Renato, Emerson, Ronaldinho, Anderson, Lucas... O torcedor gremista sempre pôde confiar na gurizada. E ela desperta grandes expectativas em Felipão. A mais nova joia gremista tem nome de ex-presidente dos Estados Unidos. Lincoln Henrique Oliveira dos Santos tem 16 anos. É um armador canhoto, de rara habilidade, e sério candidato a ganhar uma vaga no time titular durante a temporada. Para se ter uma ideia da aposta que se faz em Lincoln, o investidor Delcir Sonda, o mecenas colorado, que colocou no Beira-Rio nomes como D’Alessandro, Aránguiz, Kléber, Bolaños e Luque, além de ter feito caixa com Neymar e Ganso, é o representante do garoto.
Foi Sonda quem orientou Lincoln na assinatura do contrato por três anos com o Grêmio. Paga ao jogador uma mesada de 6.000 reais, além de casa para a família e apartamento para o guri. Lincoln já esteve em quase todas as seleções brasileiras de base e recentemente assinou contrato com a Nike. Sem modéstia, um confiante Lincoln diz que deseja ser o melhor jogador do mundo.
Alguém do tamanho de Messi, de Neymar, de Ronaldinho. Felipão e o Grêmio contam com isso. Se possível, ainda em 2015.
GRITO NÃO GANHA JOGO
Homem de confiança de Felipão enquanto era jogador, Emerson não vê no treinador a salvação
Depois de conquistar a Libertadores, o Brasileirão e duas Copas do Brasil com o Grêmio, Emerson ganhou o mundo e foi parar na seleção. Hoje é dono do Fragata, um clube da cidade de Pelotas, cuja prioridade é formar talentos e mandar os melhores para a Roma. Emerson era o centro do time de Felipão. A engrenagem entre o meio-campo e o ataque. Tem dúvidas sobre as chances de sucesso de seu antigo treinador na nova empreitada.
“Gritos e motivação por si só não ganham mais jogos. O futebol mudou muito, não é mais como 18, 20 anos atrás. O treinador precisa estar atualizado”, diz. Aos 38 anos, o ex-volante lembra que o Grêmio dos anos 1990, com uma boa estrutura, buscou jogadores pontuais para as posições nas quais não tinha peças na base. “Foram contratados jogadores com um custo-benefício espetacular. Paulo Nunes, Jardel, Adílson... Nenhum deles era medalhão. Tornaram-se medalhões no Grêmio”, afirma. “Agora o clube está sendo obrigado a recorrer à base, porque tem poucos recursos para contratar. Acredito que o Felipão consiga montar um time competitivo, mas acho difícil obter de novo um momento como aquele.”
VEJA TAMBÉM
- Inter recebe provocações de Renato após derrota do Grêmio no clássico grenal
- EVITOU O PIOR? Torcedor agradece Marquesín após evitar derrota elástica no Gre-Nal.
- Renato elogia desempenho do Grêmio e alfineta o Internacional após Gre-Nal.
Era 30 de agosto de 1995 em Medellín, na Colômbia. Aristizábal havia feito o primeiro gol do Nacional contra o Grêmio de Felipão, que mantinha o limite da vantagem adquirida com a vitória por 3 x 1, em Porto Alegre. Dinho, de pênalti, a 5 minutos do fim, encerrou o sofrimento. O Tricolor era campeão da América. Nos 20 anos que se seguiram, o sonho gremista era apoderar-se da máquina que Marty McFly usou para viajar no tempo em 1985, no filme De Volta para o Futuro. Por coincidência, o segundo episódio da trama o transportava para 2015.
E aqui estamos. A máquina do tempo gremista transporta o torcedor, nostálgico de títulos, duas décadas para o passado. O Olímpico ainda existe, mas é na novíssima Arena que o time manda seus jogos. A esperança do reencontro com a época de ouro está personificada em um personagem, o operador da máquina que pode devolver o Grêmio à sua época de ouro.
Sim, é Felipão. O reencontro promovido no ano passado, em meio ao Brasileirão, foi um acerto de contas entre duas histórias que pediam para ser reescritas. Só uma entidade no mundo não havia condenado o treinador pelo 7 x 1 da Alemanha em cima da seleção. E foi a torcida do Grêmio. Enquanto o mundo de Luiz Felipe Scolari parecia se desconstruir gol a gol no Mineirão, Fábio Koff começava a pavimentar o retorno do mito gremista ao clube com um mantra: Felipão precisa do Grêmio, o Grêmio precisa de Felipão.
Felipão entre Carlos Miguel e Paulo Nunes, chefiava o time campeão da América em 1995 | Crédito: Edison Vara
Oito dias depois da eliminação do Brasil da Copa do Mundo, em 8 de julho, o então presidente gremista telefonou para Felipão. Precisava resgatar a temporada, o que não ocorrera com a manutenção de Enderson Moreira. Juntos, Koff e Scolari levaram o clube a conquistar a Copa do Brasil, o Brasileirão e a Libertadores. Por pouco não venceram também o Mundial. Naquele tempo, meados dos anos 90, o Grêmio mandava no país, era temido, seu torcedor estava feliz, e o clube ganhou dois Gauchões, chegando a apelidá-lo de “Cafezinho” (porque vinha depois dos muitos banquetes nacionais e continentais) e de “Ruralito”, ao bater o arquirrival escalando o time B — este, por sua vez, alcunhado pelos gremistas de Banguzinho. Koff e Felipão eram os personagens mais famosos do Rio Grande.
Os anos foram passando e os títulos, rareando. Mas Felipão jamais perdeu a aura de herói gremista. Ao contrário: sua lenda foi crescendo, de geração em geração. “Desde que voltei para o Grêmio, meu objetivo era trazer o Felipão de volta. Que possamos devolver ao Grêmio o que é do Grêmio, a alegria que está faltando aos gremistas”, discursou Koff, em tom solene e realista, ao apresentar o técnico em 30 de julho, ainda com o Brasil sob o choque da goleada e da superioridade da Alemanha, que conquistou o tetracampeonato mundial no Maracaña.
No Sul, Felipão é Felipão. Nada de Scolari ou de Luiz Felipe Scolari. É o gringo (gíria gaúcha para os descendentes de italianos) que saiu de Caxias do Sul para conquistar o mundo. Foi apresentado na Arena, sob a ovação de 5.000 torcedores. “Se eu pensei, ou fui induzido a pensar em voltar ao futebol logo depois de um trabalho, o único time que eu pensaria seria o Grêmio. Eu também preciso de um abraço, de um carinho, de pessoas que me ajudem. O Grêmio é esse time. Todos sabem que aqui é minha casa. O único time a que eu voltaria seria o Grêmio”, derreteu-se Felipão, ao ser apresentado e receber a camisa tricolor, com o número 1 às costas.
Reproduzir uma das melhores formações do Grêmio em todos os tempos não será fácil até mesmo para o histórico treinador.
Afinal, há poucos recursos em caixa para contratações, assim como nos anos 1990. Porém, o futebol está bem mais caro. “O clube busca dinheiro, investidores, mas tudo está mais difícil hoje. O jogador que aceitar um contrato com o Grêmio virá conhecendo a realidade do clube. O Grêmio não pode ficar muito para trás com relação aos demais clubes do Brasil”, afirma Dinho, camisa 5 em 1995.
O fim do sonho da América em 2015, com a perspectiva do deficitário Estadual mais uma insossa fase inicial da Copa do Brasil no primeiro semestre, fzeram com que o Grêmio enfasse o pé no freio. A folha foi reduzida de 7,5 milhões de reais para 4 milhões. Em 2014, houve difculdades para manter em dia premiações e contratos de imagem dos atletas. As (poucas) contratações para 2015 não foram muito animadoras: o meia Douglas, ex-Vasco, bancado por Felipão, e o polivalente Marcelo Oliveira, que fez fraca campanha com o Palmeiras em 2014 — mais o retorno do atacante Marcelo Moreno, que já deixou o clube. Dudu, Fernandinho, Pará, Bressan e Zé Roberto deixaram a Arena. A solução está na base do clube.
“Estamos resgatando uma cultura do Grêmio”, diz o presidente Romildo Bolzan Júnior. O dirigente entende que os períodos são diferentes. Apenas Felipão faz a ponte entre eles. “São jogadores e épocas distintas. Nossa situação financeira é bem pior do que nos anos 90. Lá, ao menos tínhamos receitas com o Olímpico, que não temos mais”, afirma, destacando as dificuldades financeiras desde a mudança para a Arena, um negócio que ainda não rendeu o esperado.
Antes e depois | Crédito: Divulgação
E o resgate dessa tradição, da cultura e do espírito de clube, está, sim, no avalista Felipão. É ele quem tem a missão de devolver para o time principal o grande patrimônio gremista — os garotos formados na Azenha. “É a nossa história. Formamos nossos jogadores. Jogadores que sobem identifcados com o Grêmio. Foi assim também nos anos 90”, diz o presidente.
Para Romildo, Luiz Felipe Scolari é quem dará peso ao novo projeto: “Ele tem estatura técnica e de desempenho, que avaliza qualquer projeto. E dá segurança para quem está nele. Imagina um guri da base olhando para o Felipão e escutando os ensinamentos dele? Sempre fará o que o técnico pede, porque aquele homem tem uma história gremista e campeã”, afirma o dirigente.
Antes e depois | Crédito: Divulgação
Luiz Carlos Silveira Martins, o Cacalo, vice de futebol do Grêmio de Felipão nos anos 90, observa que a mística é para o inconsciente coletivo da torcida. “Não houve mística na época, mas uma avaliação correta de bons jogadores. De cara, vencemos o Gauchão de 1993, fomos vice da Copa do Brasil daquele ano, mas conseguimos aliviar um pouco a pressão e ganhamos tempo para remontar o time para 1994, quando conquistamos a Copa do Brasil. O problema é que, hoje, o clube vem acumulando maus resultados e a pressão só cresce.”
Cacalo recorda que o pulo para 1995 começou em meados do ano anterior, com a análise de reforços. Dinho e Goiano eram os “veteranos” da lista, bem como o paraguaio Rivarola. Do Rio, vieram os “descartados” Magno e Paulo Nunes, ambos do Flamengo, e Jardel, do Vasco. O maior investimento (valor que não chega perto do que se paga hoje para contratar um juvenil) foi no lateral-direito do Cerro Porteño.
“O Grêmio daquele período também não tinha dinheiro para investir. Porém, os valores da época não eram proibitivos. No fim, Arce foi nosso maior investimento. Também era o mais desconhecido. Caíram de pau na contratação”, conta Cacalo, com um sorriso irônico ao se referir ao sucesso do paraguaio.
Curiosamente, é na penúria que a mitologia de Scolari ganha corpo. A comparação com os anos 90 é inevitável. Naquele tempo, um Grêmio com poucos recursos montou uma equipe formidável, a partir de jovens da base (Danrlei, Carlos Miguel, Arílson, Roger e Emerson). “Se há alguém que pode clonar aquela equipe, certamente é Felipão”, afirma Roger, o lateral-esquerdo dos vitoriosos anos 90. “A ideia de jogo de Felipão permanece a mesma: defesa forte, meio-campo sólido e ataque veloz. De preferência, com um homem de área.”
No tricolor gaúcho, histórico de Felipão é e aposto em promessas, como Luan, meia de 22 anos | Crédito: Edison Vara
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O Grêmio de hoje ainda é uma obra em execução, mas há convicções de que é possível repetir a história ou voltar no tempo. Mais do que nunca, o Grêmio precisa de Felipão, assim como Felipão precisa do Grêmio para retomar o curso vitorioso de sua carreira, abalada no último Mundial. Quem sabe, a exemplo de Marty McFly, a fantasiosa máquina tricolor volte 20 anos no tempo para direcionar o curso vitorioso do clube, consagrado na era do Olímpico, rumo à Arena.
AS FAMÍLIAS DE SCOLARI
Comparando os perfis da maioria das equipes de Felipão, a primeira característica que se destaca é a do setor ofensivo. Em todos os times — mesmo quando atua com cinco jogadores no meio-campo, como no Grêmio de 2014 —, ele opta por um atacante de velocidade e um centroavante de área.
Grêmio de 1995
No papel, era um 4-4-2. No campo, no entanto, o time se comportava no mais atual 4-2-3-1, com dois zagueiros (Rivarola e Adílson), dois laterais que apoiavam (Arce e Roger), dois volantes alinhados e disciplinados na marcação (Dinho e Goiano) com Arílson na articulação.
Carlos Miguel aparecia no meio, mas caía mais pelo lado esquerdo do ataque, como um ponta. Paulo Nunes voltava para recompor o meio pela direita e protegia as descidas de Arce. Jardel era o único homem fixo no ataque. As linhas na marcação comumente se adiantavam.
Grêmio de 2015
Não abre mão de ter um legítimo camisa 9. Por isso, com as saídas de Barcos e Marcelo Moreno, o Grêmio vive uma crise no setor. No meio-campo, normalmente utiliza dois volantes na proteção da defesa e dois meias mais soltos. Nas laterais, os times de
Felipão costumam ter um lateral mais ofensivo do que o outro, e os dois raramente sobem ao ataque ao mesmo tempo.
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GRITO NÃO GANHA JOGO
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“Gritos e motivação por si só não ganham mais jogos. O futebol mudou muito, não é mais como 18, 20 anos atrás. O treinador precisa estar atualizado”, diz. Aos 38 anos, o ex-volante lembra que o Grêmio dos anos 1990, com uma boa estrutura, buscou jogadores pontuais para as posições nas quais não tinha peças na base. “Foram contratados jogadores com um custo-benefício espetacular. Paulo Nunes, Jardel, Adílson... Nenhum deles era medalhão. Tornaram-se medalhões no Grêmio”, afirma. “Agora o clube está sendo obrigado a recorrer à base, porque tem poucos recursos para contratar. Acredito que o Felipão consiga montar um time competitivo, mas acho difícil obter de novo um momento como aquele.”
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