Mesmo sem enfrentar crise financeira ou bagunça generalizada em sua gestão – motivos frequentes para rebaixamentos de grandes clubes –, o Grêmio caiu para a segunda divisão em 2021 e condenou o trabalho da administração inteira, sob liderança de Romildo Bolzan Júnior.
Nunca esteve tão evidente como, no futebol, departamentos diferentes podem chegar a resultados discrepantes. Financeiro e futebol, principalmente. Quem olha apenas para os números não consegue imaginar que o desfecho da temporada, em campo, seria tão ruim.
No fim das contas, não importam tanto os bons indicadores financeiros. Se o time perde, e o ano acaba em rebaixamento, muita coisa deu errado na gestão. Neste caso incomum, portanto, a leitura se interessa não por saber se as finanças prejudicaram o futebol, e sim por entender por que houve o fracasso esportivo, apesar do balanço no azul.
Faltou investimento? Houve excesso de austeridade? Como o clube estava posicionado, financeiramente, em relação a adversários? Neste texto, com base nas demonstrações contábeis de 2021, o ge tenta esclarecer ao torcedor como as finanças interferiram no campo.
Panorama
O primeiro degrau, na análise das contas gremistas, coloca em paralelo o faturamento (tudo o que foi arrecadado em cada ano) e o endividamento (o que havia a pagar no fim de cada exercício).
De cara, é possível notar que o Grêmio mudou uma tendência. O clube havia reduzido suas dívidas a um patamar proporcionalmente baixo, próximo dos R$ 250 milhões, enquanto a receita havia parado por volta dos R$ 400 milhões. O cenário era positivo e animador, nesse sentido.
Em 2021, a arrecadação voltou a dar um salto – explicado em partes por uma questão contábil, e não por um crescimento de fato. Mais importante, o endividamento aumentou sensivelmente em relação ao que estava em aberto ao fim de 2020. Algo coisa aconteceu na virada.
Receitas
A principal receita de qualquer clube de futebol está nos direitos de transmissão e nas premiações, oriundas também da televisão de competições em mata-mata. O Grêmio não é diferente.
Existe uma ressalva importante. Como o Campeonato Brasileiro de 2020 só terminou em 2021, parte relevante de seus pagamentos foi contabilizada como receita do exercício seguinte. O balanço tricolor mostra R$ 64 milhões no ano retrasado e R$ 158 milhões no passado.
A consequência prática disso é que a receita de 2020 ficou abaixo do que deveria, enquanto a de 2021 foi artificialmente elevada. Prática comum a todos os clubes. É importante ter esse detalhe em mente ao avaliar o crescimento da receita gremista entre esses dois exercícios fiscais.
No mais, o desempenho do Grêmio na Copa do Brasil (quartas de final) e na Libertadores (terceira fase) tirou outra parte significativa do faturamento. Ambas as premiações despencaram no último balanço.
Na área comercial e de marketing, em que contam patrocínios, publicidades e licenciamentos, o Grêmio vem de sólido crescimento nos últimos cinco anos. Não há o que criticar.
Receitas ligadas à torcida se limitam à associação, pois as bilheterias da Arena do Grêmio ainda não chegam ao caixa do clube – o estádio é administrado por uma empresa separada. Mesmo que chegassem, a pandemia prejudicou essa linha de arrecadação em todo o país.
Nas transferências de atletas, está um ponto forte. Pelo quarto ano consecutivo, a receita com vendas passou dos R$ 100 milhões. As saídas de Pepê, Diego Rosa, Matheus Henrique e Ruan foram as maiores entre os R$ 158 milhões líquidos (após descontos de terceiros).
Orçado versus realizado
A jornada financeira do Grêmio em 2021 também pode ser analisada por meio da comparação entre orçamento (o que a diretoria planejava antes de a temporada começar) e balanço (com resultados).
Na arrecadação, não houve problemas. A receita com sócios ficou um pouco abaixo do projetado, mas essa frustração foi compensada, com sobras, por todas as outras, em especial pelos atletas.
Entre os gastos, o ge separa a folha salarial do futebol – combinação de salários, direitos de imagem, encargos trabalhistas e premiações. Este é o item que costuma ter maior correlação com resultados em campo, pois reflete a qualidade do elenco. O Grêmio, bem, abriu uma exceção.
Em 2021, a diretoria tricolor gastou muito mais do que havia planejado. No total, foram R$ 227 milhões aplicados. A sexta maior folha do país, muito próxima da que teve o Corinthians.
No resultado financeiro, constam juros sobre dívidas, variações cambiais e outros itens não esportivos. As finanças em ordem evitam que se perca muito dinheiro nesse sentido.
E o resultado líquido aponta para superavit (lucro) ou deficit (prejuízo). O clube gaúcho terminou o ano com as contas no azul, ponto timidamente positivo. Tímido, porque não chega a ser o indicador econômico mais importante, nem ele se sobrepõe ao que ocorre em campo.
Dívidas
No endividamento, o detalhamento começa pelo prazo. Durante os mandatos de Romildo, o Grêmio conseguiu reduzir muito os valores que deveriam ser pagos no curto prazo (em menos de um ano). Era um dos pontos positivos, pois havia cada vez menos pressão sobre o caixa.
Em 2021, a associação tomou a decisão de aumentar as suas dívidas, principalmente as de curto prazo. Havia R$ 158 milhões a pagar no último dia de dezembro, valor que será cobrado pelos credores gremistas no decorrer de 2022. Ainda não é um valor preocupante, mas ele aumentou.
No longo prazo, também há R$ 158 milhões. Uma coincidência, que deixa o endividamento em proporções iguais. Essas obrigações serão exigidas em período superior a um ano, portanto a partir de 2023.
O que aumentou, considerando a natureza de cada dívida? Entre empréstimos bancários e financiamentos, houve pequeno aumentou, pois o Grêmio pegou R$ 20 milhões com o Banrisul. Este valor se divide em curto e longo prazos, com última parcela em dezembro de 2023.
O maior crescimento, no entanto, está no que o balanço descreve como "contas a pagar por compra ou empréstimo de atletas". O clube havia terminado 2020 com R$ 21 milhões a pagar nessa linha, e ao término de 2021 essa dívida subiu para R$ 69 milhões.
Este é o sinal para uma mudança de estratégia que não surtiu efeito algum. No ano em que decidiu comprar direitos de novos atletas, elevando seu endividamento, o Grêmio foi rebaixado.
No gráfico abaixo, as dívidas trabalhistas incluem valores correntes (que dizem respeito à própria temporada) e aqueles que estão sendo cobrados por ex-jogadores, ex-técnicos e ex-funcionários em ações judiciais. O passado responde por apenas 44% do total, nessa coluna específica.
Em "outros", estão fornecedores, clubes e agentes. Esta é a parte que foi puxada para cima pelas aquisições feitas para reforçar o futebol, principalmente, entre direitos de atletas e comissões.
Futuro
Pragmaticamente, cabe ao Grêmio voltar para a primeira divisão o mais rápido possível, também pelo aspecto financeiro, pois direitos de transmissão serão recuperados. Mas isto é obviedade. Mais importante é tirar lições da queda em 2021, pois este não foi um descenso comum.
Não faltou dinheiro. Faz tempo que os indicadores econômicos tricolores estão entre os melhores do país: receitas crescentes, gastos sob controle, endividamento gradativamente reduzido.
Nem faltou investimento. Só no ano passado, saíram do caixa gremista R$ 93 milhões para comprar direitos federativos e econômicos de atletas – fora o que ficou parcelado, para pagar nos anos seguintes. Claramente, o problema não foi falta de ambição, e sim a aplicação desses recursos.
Essa circunstância já afasta o Grêmio de 2021 de outros fracassos históricos, como o descenso de 2002. Na época, a associação apertava as suas contas em uma austeridade desvairada, posterior à parceria com a ISL. Naquela época, faltava dinheiro, investimento e elenco. Agora, não.
A análise da folha salarial é a mais importante, nesse sentido. Com R$ 227 milhões gastos – repito: a sexta maior do país –, era de se esperar que o time fosse ficar na parte de cima da tabela no Brasileirão de 2021, lutando pela classificação direta para a Libertadores de 2022.
Ou seja, houve ineficiência em todos os aspectos: nas contratações e nos salários. Fez pouco ou nada com muito dinheiro. E a responsabilidade recai totalmente sobre o departamento de futebol.
Remoer as memórias sobre este ou aquele jogador do elenco rebaixado, tal decisão do árbitro, nada disso adianta. O Grêmio precisa rever toda a sua governança, em particular do futebol, para compreender o que deu errado. Houve interferência amadora? A montagem da comissão técnica se baseou em quê? Como foram escolhidos os atletas? Perguntas que as demonstrações contábeis infelizmente não respondem.
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Nunca esteve tão evidente como, no futebol, departamentos diferentes podem chegar a resultados discrepantes. Financeiro e futebol, principalmente. Quem olha apenas para os números não consegue imaginar que o desfecho da temporada, em campo, seria tão ruim.
No fim das contas, não importam tanto os bons indicadores financeiros. Se o time perde, e o ano acaba em rebaixamento, muita coisa deu errado na gestão. Neste caso incomum, portanto, a leitura se interessa não por saber se as finanças prejudicaram o futebol, e sim por entender por que houve o fracasso esportivo, apesar do balanço no azul.
Faltou investimento? Houve excesso de austeridade? Como o clube estava posicionado, financeiramente, em relação a adversários? Neste texto, com base nas demonstrações contábeis de 2021, o ge tenta esclarecer ao torcedor como as finanças interferiram no campo.
Panorama
O primeiro degrau, na análise das contas gremistas, coloca em paralelo o faturamento (tudo o que foi arrecadado em cada ano) e o endividamento (o que havia a pagar no fim de cada exercício).
De cara, é possível notar que o Grêmio mudou uma tendência. O clube havia reduzido suas dívidas a um patamar proporcionalmente baixo, próximo dos R$ 250 milhões, enquanto a receita havia parado por volta dos R$ 400 milhões. O cenário era positivo e animador, nesse sentido.
Em 2021, a arrecadação voltou a dar um salto – explicado em partes por uma questão contábil, e não por um crescimento de fato. Mais importante, o endividamento aumentou sensivelmente em relação ao que estava em aberto ao fim de 2020. Algo coisa aconteceu na virada.
Receitas
A principal receita de qualquer clube de futebol está nos direitos de transmissão e nas premiações, oriundas também da televisão de competições em mata-mata. O Grêmio não é diferente.
Existe uma ressalva importante. Como o Campeonato Brasileiro de 2020 só terminou em 2021, parte relevante de seus pagamentos foi contabilizada como receita do exercício seguinte. O balanço tricolor mostra R$ 64 milhões no ano retrasado e R$ 158 milhões no passado.
A consequência prática disso é que a receita de 2020 ficou abaixo do que deveria, enquanto a de 2021 foi artificialmente elevada. Prática comum a todos os clubes. É importante ter esse detalhe em mente ao avaliar o crescimento da receita gremista entre esses dois exercícios fiscais.
No mais, o desempenho do Grêmio na Copa do Brasil (quartas de final) e na Libertadores (terceira fase) tirou outra parte significativa do faturamento. Ambas as premiações despencaram no último balanço.
Na área comercial e de marketing, em que contam patrocínios, publicidades e licenciamentos, o Grêmio vem de sólido crescimento nos últimos cinco anos. Não há o que criticar.
Receitas ligadas à torcida se limitam à associação, pois as bilheterias da Arena do Grêmio ainda não chegam ao caixa do clube – o estádio é administrado por uma empresa separada. Mesmo que chegassem, a pandemia prejudicou essa linha de arrecadação em todo o país.
Nas transferências de atletas, está um ponto forte. Pelo quarto ano consecutivo, a receita com vendas passou dos R$ 100 milhões. As saídas de Pepê, Diego Rosa, Matheus Henrique e Ruan foram as maiores entre os R$ 158 milhões líquidos (após descontos de terceiros).
Orçado versus realizado
A jornada financeira do Grêmio em 2021 também pode ser analisada por meio da comparação entre orçamento (o que a diretoria planejava antes de a temporada começar) e balanço (com resultados).
Na arrecadação, não houve problemas. A receita com sócios ficou um pouco abaixo do projetado, mas essa frustração foi compensada, com sobras, por todas as outras, em especial pelos atletas.
Entre os gastos, o ge separa a folha salarial do futebol – combinação de salários, direitos de imagem, encargos trabalhistas e premiações. Este é o item que costuma ter maior correlação com resultados em campo, pois reflete a qualidade do elenco. O Grêmio, bem, abriu uma exceção.
Em 2021, a diretoria tricolor gastou muito mais do que havia planejado. No total, foram R$ 227 milhões aplicados. A sexta maior folha do país, muito próxima da que teve o Corinthians.
No resultado financeiro, constam juros sobre dívidas, variações cambiais e outros itens não esportivos. As finanças em ordem evitam que se perca muito dinheiro nesse sentido.
E o resultado líquido aponta para superavit (lucro) ou deficit (prejuízo). O clube gaúcho terminou o ano com as contas no azul, ponto timidamente positivo. Tímido, porque não chega a ser o indicador econômico mais importante, nem ele se sobrepõe ao que ocorre em campo.
Dívidas
No endividamento, o detalhamento começa pelo prazo. Durante os mandatos de Romildo, o Grêmio conseguiu reduzir muito os valores que deveriam ser pagos no curto prazo (em menos de um ano). Era um dos pontos positivos, pois havia cada vez menos pressão sobre o caixa.
Em 2021, a associação tomou a decisão de aumentar as suas dívidas, principalmente as de curto prazo. Havia R$ 158 milhões a pagar no último dia de dezembro, valor que será cobrado pelos credores gremistas no decorrer de 2022. Ainda não é um valor preocupante, mas ele aumentou.
No longo prazo, também há R$ 158 milhões. Uma coincidência, que deixa o endividamento em proporções iguais. Essas obrigações serão exigidas em período superior a um ano, portanto a partir de 2023.
O que aumentou, considerando a natureza de cada dívida? Entre empréstimos bancários e financiamentos, houve pequeno aumentou, pois o Grêmio pegou R$ 20 milhões com o Banrisul. Este valor se divide em curto e longo prazos, com última parcela em dezembro de 2023.
O maior crescimento, no entanto, está no que o balanço descreve como "contas a pagar por compra ou empréstimo de atletas". O clube havia terminado 2020 com R$ 21 milhões a pagar nessa linha, e ao término de 2021 essa dívida subiu para R$ 69 milhões.
Este é o sinal para uma mudança de estratégia que não surtiu efeito algum. No ano em que decidiu comprar direitos de novos atletas, elevando seu endividamento, o Grêmio foi rebaixado.
No gráfico abaixo, as dívidas trabalhistas incluem valores correntes (que dizem respeito à própria temporada) e aqueles que estão sendo cobrados por ex-jogadores, ex-técnicos e ex-funcionários em ações judiciais. O passado responde por apenas 44% do total, nessa coluna específica.
Em "outros", estão fornecedores, clubes e agentes. Esta é a parte que foi puxada para cima pelas aquisições feitas para reforçar o futebol, principalmente, entre direitos de atletas e comissões.
Futuro
Pragmaticamente, cabe ao Grêmio voltar para a primeira divisão o mais rápido possível, também pelo aspecto financeiro, pois direitos de transmissão serão recuperados. Mas isto é obviedade. Mais importante é tirar lições da queda em 2021, pois este não foi um descenso comum.
Não faltou dinheiro. Faz tempo que os indicadores econômicos tricolores estão entre os melhores do país: receitas crescentes, gastos sob controle, endividamento gradativamente reduzido.
Nem faltou investimento. Só no ano passado, saíram do caixa gremista R$ 93 milhões para comprar direitos federativos e econômicos de atletas – fora o que ficou parcelado, para pagar nos anos seguintes. Claramente, o problema não foi falta de ambição, e sim a aplicação desses recursos.
Essa circunstância já afasta o Grêmio de 2021 de outros fracassos históricos, como o descenso de 2002. Na época, a associação apertava as suas contas em uma austeridade desvairada, posterior à parceria com a ISL. Naquela época, faltava dinheiro, investimento e elenco. Agora, não.
A análise da folha salarial é a mais importante, nesse sentido. Com R$ 227 milhões gastos – repito: a sexta maior do país –, era de se esperar que o time fosse ficar na parte de cima da tabela no Brasileirão de 2021, lutando pela classificação direta para a Libertadores de 2022.
Ou seja, houve ineficiência em todos os aspectos: nas contratações e nos salários. Fez pouco ou nada com muito dinheiro. E a responsabilidade recai totalmente sobre o departamento de futebol.
Remoer as memórias sobre este ou aquele jogador do elenco rebaixado, tal decisão do árbitro, nada disso adianta. O Grêmio precisa rever toda a sua governança, em particular do futebol, para compreender o que deu errado. Houve interferência amadora? A montagem da comissão técnica se baseou em quê? Como foram escolhidos os atletas? Perguntas que as demonstrações contábeis infelizmente não respondem.
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Diretoria q nao entende futebol deu nisso toecedores avisaram
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