Roger é só sorrisos no CT gremista (Foto: Eduardo Moura/GloboEsporte.com)
O humor de Roger anda muito bom. Também pudera. A última semana foi próxima da perfeição para o treinador. Seu Grêmio se tornou uma das sensações do Brasil ao golear o Inter num Gre-Nal histórico de 5 a 0 e depois bater o Atlético-MG, até então líder e uma das melhores equipes do país, com direito a gol em contra-ataque que assombrou o mundo. O técnico recebeu o GloboEsporte.com para uma conversa no campo do CT Luiz Carvalho, na manhã deste sábado, esbanjando alegria e com uma cuia de chimarrão em punho para uma rápida entrevista - ou aula? - sobre futebol.
Iria depois para a concentração, onde costuma assistir de dois a três jogos do futebol mundial - o detalhe é que prefere acelerar a velocidade da imagem em duas vezes. Anota uma parte em uma caderneta, enquanto deixa outras informações guardadas na memória, para que se englobem com seus conhecimentos e possam virar jogadas específicas, como os belos gols marcados no Mineirão. Didático, Roger sempre explica tudo o que quer para os jogadores antes dos treinamentos. O mesmo ocorreu durante a entrevista, quando ampliou suas teorias e falou sobre sua preparação no meio acadêmico para conseguir uma chance. Que ele pareceu aproveitar como poucos profissionais.
Afinal, o Grêmio é terceiro colocado do Brasileirão, com 33 pontos, atrás apenas de Atlético-MG e Corinthians. Nada mal para quem iniciou a competição desacreditado e contratou o novato de 40 anos há três meses, precisando substituir um ídolo do clube, Felipão, demitido após não conseguir tirar mais de seu elenco. Antes mesmo do atual bom momento, tivera início promissor, com direito a cinco vitórias seguidas - depois, oscilou. Até voltar a chamar de vez a atenção do Brasil, com sete gols em dois jogos.
- Receber a oportunidade. Vejo como um ciclo. É um processo, de períodos em períodos. O que nós treinadores mais jovens temos que fazer é continuar nos capacitando, para que, quando as oportunidades apareçam, a gente consiga aproveitá-las para ganhar espaço neste restrito mundo - destacou Roger, otimista com o Brasil: - Nossa forma de jogar está retornando a raiz do nosso futebol: que é ter a posse, mantê-la para mim, criar movimentos dentro do jogo através da troca de passes, para permitir que nossos jogadores de lado de campo, que tenham vitória pessoal, sejam colocados em condições de um para um, cheguem através da vitória pessoal no terço final do campo com bastante gente na área. É o que tem me deixado animado, tenho visto cada vez mais isso.
O treinador ainda discorreu sobre os métodos de trabalho diário e a sua relação com a academia - é formado em Educação Física pela Sogipa, em Porto Alegre. E deixou claro que está sempre atento a novos elementos para arquitetar treinos. Por exemplo, o centroavante Braian Rodríguez, com um chute no gol, o incentivou a criar um trabalho diferente.
- Costumo dizer que, por vezes, os jogadores brasileiros são uma Ferrari engatada em segunda. Me sinto responsável por elevar o nível do meu jogador no dia a dia.
De chuteiras brancas, senhoras e senhores, Roger Machado.
Confira a entrevista:
GloboEsporte.com: Como ocorreu o início da sua carreira e a sua escolha por ser treinador?
Roger: Vou começar pelo fim da carreira de jogador. Eu tinha como planejamento jogar até os 35 anos. No final de 2008, por um problema na coluna, eu decidi encerrar a carreira. Me recuperei, fiz um contrato com o DC United, dos Estados Unidos, mas não passei da pré-temporada, porque tive outra crise de hérnia de disco. Mas, antes disso, já havia feito vestibular e trancado a matrícula para um eventual retrocesso, o que aconteceu. Antes de parar, já havia identificado que, primeiro, queria ser treinador de futebol. Mas, entendia que tinha que me desligar completamente da figura de jogador, passar um tempo na minha cidade natal, com minha família, e me capacitar para ter um diferencial competitivo nesta outra carreira. Fui buscar na faculdade de educação física os elementos que hoje norteiam o meu trabalho.
Depois veio o Grêmio, como auxiliar...
Dois anos à frente, fui chamado para ser o auxiliar da comissão permanente do clube, que estava sabendo formada. Neste meio tempo, fiz um curso de gestão esportiva, para entender um pouco mais, de forma mais ampla, não só questões do campo. Nestes três anos como auxiliar técnico, assumi o time como treinador auxiliar ou por concomitância de duas competições e o treinador principal estar na Libertadores, ou pela ausência dos treinadores motivada pelas saídas destes. No final de 2013, já formado em Educação Física, entendia que tinha que cumprir a última etapa e ser treinador principal de uma equipe. Entendia que tinha que ter essas experiências fora do clube, em outro ambiente. Pedi a saída para em janeiro de 2014 assumir como treinador do Juventude.
Ou seja, virou técnico de futebol...
Assumi no Regional, fiz o campeonato, levamos até a fase que fomos eliminados pelo próprio Grêmio, fiz metade da Série C e saí, depois de duas derrotas em casa, estando invicto até então, em terceiro lugar no campeonato. Fiz um período de observação e estágio na Itália, com o Roberto, meu auxiliar. Além de observação de treinamentos do Chievo, por convite de um amigo que ia fazer, o Adaílton, que jogou muito tempo lá. Como o futebol dá uma rede de relacionamentos, através dos amigos… através do Thiago Silva, fui ver Olympique de Marselha em Paris. Mandei uma mensagem para o Marcelo e ele traz dois ingressos para Real Madrid e Barcelona. Falo com um amigo na Inglaterra para conseguir ingresso para ver Crystal Palace e Sunderland, aí compra outros… Durante 33 dias, além da semana de observação, que foi preciosa para mim no Chievo, vi 9 ou 10 jogos. Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Itália... Fui ver o 7 a 1 de Roma e Bayern. Peguei jogos bons. Fiz questão de escolher jogos de diferentes níveis, culturas. Time grande contra grande, médio contra médio, pequeno contra pequeno. Para ter uma amostragem maior, ver semelhanças e diferenças neste ambiente. Voltei e no final de dezembro, acertei com o Novo Hamburgo para fazer o Regional. Fomos até depois da fase classificatória, nos deparamos com o Grêmio e saímos nas penalidades. Fiquei aguardando a movimentação do mercado, esperando a oportunidade. E veio de onde eu menos esperava naquele momento, pelo estágio que eu estava na carreira. Nas entrevistas que dei quando saí em 2013, disse que, a partir daquele momento, o que me movia era fazer bons trabalhos para ser lembrado.
E foi lembrado.
E fui. Felizmente, cá estou eu.
O que mais o moldou, nesta caminhada, no treinador que você é hoje? Tem algum ponto especial?
Tive 17 anos como jogador de futebol no alto nível. Tive mais de 30 treinadores. Sem dúvida aprendi com todos. Algumas coisas, seja o modo de dar o treinamento, o de dar uma palestra, gerenciar o grupo, fazer um intervalo, administrar torcida, diretor, imprensa. Com todos, tive a felicidade de vivenciar e aprender alguma coisa. Sempre fui observador nisso. Minha construção começa desde a minha carreira de futebol. Claro que tu tem a tua personalidade e absorve, e dentro dos teus traços, monta teu perfil. A faculdade de educação física talvez tenha sido um divisor nesta construção porque me permitiu abrir a mente e a cabeça para algo que constantemente está em adaptação, evolução. Os processos metodológicos e conceituais. Toda hora há algo novo sendo feito. A faculdade me permitiu desfrutar de tudo isso, receber um conhecimento que me permite administrar e mensurar minha sessão de treinamento, periodizar meu treino e minha fase no calendário, com preparador físico. Entender um pouco de fisiologia, para saber qual via metabólica estou usando na sessão de treino. Mensurar as cargas de trabalho. Entender um pouquinho de psicologia do esporte e gestão de grupo, que uso muito no dia a dia. E o ambiente acadêmico por si só me permite arejar a mente. Na minha turma, era o aluno mais velho. E, quando convive com pessoas mais jovens, isso deixa a cabeça aberta para muitas coisas.
Roger durante entrevista (Foto: Montagem em fotos de Eduardo Moura/GloboEsporte.com)
O que você consome como treinador do futebol. Assiste aos jogos de fora, lê… qual a rotina do Roger?
Na concentração, há dois momentos. O da construção da palestra e depois há um tempo que você fica disponível para outras coisas. Peço para o pessoal do nosso centro de análise do clube baixar jogos de ligas que julgo sejam importantes, mesmo que não sejam as ligas principais. . Gosto de procurar na internet, tenho uma biblioteca razoável com livros de diferentes pontos de vista, relacionados a grandes times formados, movimentações, esquemas táticos. Livros de análises estatísticas, de ligas diferentes, para ter uma amostragem e saber se os números daqui são diferentes dos de lá. E na verdade não há muita diferença. E assistir aos jogos. E tenho facilidade de enxergar. Vejo melhor quando acelero o jogo, duas vezes. Um jogo, vejo em um tempo. Por isso, vejo mais jogos. Aproveito muito daquilo, muita coisa que percebe de comportamento que é treinada. Mas alguns momentos do jogo que é a questão da tomada de decisão e improviso do jogador, que gera uma movimentação interessante. E que pode ser o princípio ou a raiz de um treinamento que você pode utilizar, porque a movimentação aconteceu pela inteligência esportiva do jogador, pela movimentação que pode ter sido aleatória, mas que abriu espaço e foi utilizado por um terceiro jogador. Guardo tudo isso para montar minha sessão de treino, idealizar o que quero e quero que esses comportamentos sejam vistos pelos jogadores.
Anota as análises ou fica na cabeça?
Muita coisa eu anoto, registro em uma caderneta de papel, em um livreto que tenho de anotações. Mas muita coisa fica guardada na cabeça, até faço questão que fique registrado na memória, na cabeça. Que fica com outras informações, que ficam conectadas, e isso faz bem para a construção das minhas ideias.
A frase na qual você se coloca como um "vendedor de ideias" não é uma novidade. Qual as ideias que você mais vendeu aqui no Grêmio?
Para mim os dois pilares principais da construção do meu trabalho é a questão do treinamento simular o jogo, em 100% do treino. Conscientizá-los que só vai jogar com intensidade se treinar com intensidade. E que o que você repete aqui vai para o jogo. Não memoriza um gesto técnico errado, repetindo no treino muitas vezes, porque você vai levar para o jogo. Treinar a concentração na atividade é muito importante. Quando se treina concentrado, o cérebro registra com mais facilidade. Não vou ficar duas horas no campo, mas vai ser uma hora com muita intensidade. Se não for intenso, não vai se condicionar. Prezo quase 100% do tempo de bola. O Rogerinho (Rogério Dias, preparador físico) trabalha também, mas se baseia muito na questão do meu trabalho, para elevar a questão da capacidade física. Se for 10 ou 20 minutos de atividade, se for intenso, vai se condicionar. Se for de forma mais lenta, não condiciona. E a questão da gestão de grupo, de conscientização que esta profissão que a gente exerce, que eu exerci, que futebol é mais que chutar uma bola. Preciso que meu jogador seja inteligente do ponto de vista esportivo para entender o que acontece no jogo. Dentro de campo a gente é o último elo da corrente, a ponta do iceberg. A parte visível do processo. Há uma estrutura e uma equipe por trás. Que é muito grande e por trás da estrutura, ainda tem 10 milhões de torcedores. Que, na verdade, é uma responsabilidade muito grande. Quando a gente consegue se permitir entender que é parte de algo maior, para mim, valoriza muito mais as coisas que acontecem no jogo.
Os gols do Mineirão foram muito falados nos últimos dias. A gente viu as imagens do treino de quarta e claramente aquilo foi treinado (veja no vídeo abaixo). Veio da observação do rival? Como é a construção das jogadas que vão para o campo?
Muito do que falei, de observação de outros jogos. Por vezes é alguma coisa construída no treinamento, mas por vezes aconteceu alguma jogada pela inteligência de um jogador, a linha estava alta e eu ver: "olha, essa bola entrou". Posso transformar isso em uma jogada, em um treino, que possa sistematizar isso. E gera um comportamento que vai para o jogo. Por que trabalhar na véspera do jogo este tipo de situação? Porque quero trabalhar com a memória de curto prazo do atleta. Vai estar guardado. Falo para fazer com concentração e atenção, que vai estar registrado. No momento certo, tu vais reagir àquela situação que foi vivenciada no treinamento. E claro muito da literatura que eu leio de outras culturas, que tem no sistema tático, no trabalho tático, uma questão muito importante. Me dá elementos. Meu próprio treino, quando acontece uma movimentação pela inteligência de deslocamento ou tomada de decisão do meu jogador, é um elemento para eu construir uma outra atividade em cima daquilo e que me dê situações.
Teve um treino que eu preparei e tinham duas goleiras que seriam da próxima atividade. Era uma posse e as goleiras estavam preparadas para a próxima. E o Braian entendeu diferente, roubou a bola e finalizou. E eu disse: "Ô, Braian, acho que tu me deu um treino". Pode deixar que vou dar autoria, vai ter o "treino Braian" (risos). Ele entendeu que estava ali a goleira, que era roubar e finalizar. Ficou interessante. Tudo isso, junto com várias coisas, me dão elementos.
Grêmio foi concebido sem referência, com Luan mais adiantado, porém, sem ser o cara que fica entre os zagueiros. É o diferencial do Grêmio, ou é simplista dizer isso?
A gente analisando desta forma, acaba sendo muito superficial. Porque se diz muito porque o Luan anterior à minha chegada jogava deslocado no lado do campo. Mas pouca gente sabe que o Luan era atacante, nesta função, na sua formação. Como tem a virtude de sair da área e criar os espaços, mas isso não impede que um centroavante de presença também faça. O grande exemplo a gente tinha conosco aqui até ano passado, o Barcos. Era um centroavante de área e que tinha facilidade de sair, abrindo espaços. Os comportamentos e princípios do nosso jogo, que procuramos trabalhar desde que chegamos, tem princípios que são a base do meu time: ter a bola, mantê-la comigo, porque acredito que ataco o adversário e também descanso com ela. Se eu a perco, tenho que retomar o mais rápido possível. Depois da perda, tenho pressão na bola, para induzir o adversário ou a mudar a velocidade do ataque, atrasando a jogada. Se houver o enfrentamento, ter a posse de novo. Jogar com amplitude. Da mesma forma que na minha saída de bola abro meus zagueiros, para sair, para entrar no último terço do campo tenho que ter essa amplitude. Questão da compactação: não é usar o impedimento, é usar a regra do fora de jogo a nosso favor. Encurtar o campo para o adversário jogar e por consequência ter mais jogadores perto da bola, para roubar ou trabalhar ela. Esses princípios todos, diariamente, a gente constrói através dos trabalhos. O resultado vai para o jogo.
Roger usa barreira metálica em treino (Foto: Lucas Uebel/Grêmio)
O Douglas é um caso à parte na sua equipe? Ele ficou mais perto do gol, com uma faixa menor para se desgastar e apresentar a qualidade?
O que digo por vezes é que a bola não precisa passar a todo momento pelo meu articulador. Não precisa ser o centralizador. A capacidade e habilidade do meia, que tem a habilidade de fazer o time andar com a bola, dá tempo do meu time sair, me dá uma jogada semifinal, assim como foi contra o Atlético-MG, tenho uma jogada final também. O que em alguns momentos, talvez tenha alterado no posicionamento, foi ele solicitar que, cada vez menos, viesse perto da linha dos meus jogadores médios, para articular o time. Para que permitisse que esses jogadores que tem por característica boa saída de jogo, sejam articuladores, e ele procure uma posição adiantada, e entre as linhas, poder usar sua capacidade. No terço final do campo, pela linha de lado, ou perto da área, que seja um jogador mais próximo da área. Que o volante se adianta e que se necessário for, tenha nos meus zagueiros articuladores da jogada. Para que eu tenha mais jogadores à frente da linha da bola, e por consequência, linhas de passes e mantenha a bola sobre o meu controle.
Você tem uma linguagem muito característica. Podemos ver os termos terço final do campo, amplitude, enfim... Já teve algum problema de passar a mensagem com jogadores?
Se ele não entender, eu uso outra linguagem (risos). É só questão de costume, de hábito, porque a linguagem é da literatura que eu leio. Vem daí. Vem dos portugueses, que escrevem muito e muitos livros holandeses, alemães, ingleses, são traduzidos para o português de Portugal. Talvez venha desta literatura. Mas não tive problema. Quando tem, eles perguntam de novo.
Roger vê "ciclo natural" para técnicos emergentes aparecerem no mercado (Foto: Reprodução)
Que dificuldade se encontra em começar a trabalhar no Brasil. Por exemplo, você, o Eduardo Baptista, técnicos emergentes, qual a principal dificuldade para aparecer no mercado?
Receber a oportunidade. Vejo como um ciclo. É um processo, de períodos em períodos. Foi assim com os treinadores na década de 70, que hoje são renomados. Acontece de tempos em tempos, há uma janela no processo, e neste momento, estamos dividindo este espaço com treinadores que têm uma história e um trabalho oferecido de grande valia, e uma geração entrando. É o processo natural. Aos poucos, isso vai acontecendo. O que nós treinadores mais jovens temos que fazer é continuar nos capacitando, para que, quando as oportunidades apareçam, a gente consiga aproveitá-las para ganhar espaço neste restrito mundo. O universo do futebol é restrito. São 20 times da Série A, 20 na Série B, 20 na Série C, 40 na D, talvez. São 100 profissionais para disputar vaga no mercado. É apertado o funil. Mais do que para jogador, que cada time tem 30, 35 no grupo.
E o futebol brasileiro? Qual sua avaliação e como está vendo o Brasileirão, por exemplo?
Nós, durante bastante tempo, exportamos muitos jogadores. E continuamos. Temos muitos jogadores lá fora. Temos, hoje, no futebol brasileiro, muitos jovens começando. Muitos jogadores retornando, depois de 10, 15 anos fora. E um núcleo de jogadores entre 25 e 28 anos. Uma variedade grande, equilíbrio grande de experiência nos times. Muitos jovens e jogadores vividos. Dá um elemento diferente. O jogo se torna mais rápido. Com a vivência, a globalização, é um jogo mais tático. E por consequência com melhor qualidade. Tanto do ponto de vista comercial como do público, um jogo que se torna mais agradável. Entendo que vai continuar evoluindo quando a gente ajustar o calendário. É o ponto de partida para o restante das questões.
Do ponto de vista do futebol, vejo com bastante satisfação. Estamos voltando nosso olhar para dentro do nosso futebol. Temos que ter o intercâmbio, ir lá fora buscar essa experiência, mas nós temos o nosso jeito de jogar. Temos nosso estilo. Estamos evoluindo do ponto de vista de metodologias mais atuais, mais modernas, que fez um jogador mais forte, mais rápido, mais resistente. Mas do nosso jogo, você vê jogadores abertos, como tínhamos um ponta esquerda. Fomentar o meia que pisa na área, que foram muitos nesta forma, Zico, Pelé jogou ali, Rivellino. Jogadores que tinham habilidade e chegavam no terço final do campo, na área, para serem decisivos. Nossa forma de jogar está retornando a raiz do nosso futebol: que é ter a posse, mantê-la para mim, criar movimentos dentro do jogo através da troca de passes, para permitir que nossos jogadores de lado de campo, que tenham vitória pessoal, sejam colocados em condições de um para um, cheguem através da vitória pessoal no terço final do campo com bastante gente na área. É o que tem me deixado animado, tenho visto cada vez mais isso.
Como se sentiu com o resultado histórico do Gre-Nal? Entre as torcidas, houve discussão sobre a repercussão da goleada, com colorados rebatendo falando de títulos...
Se o Gre-Nal tivesse acabado 1 a 0, da forma como construímos o placar, estaria muito satisfeito. É um placar atípico, tão atípico que foi há muito tempo atrás o último. Foi motivado pela circunstância do jogo. O torcedor claro que considera um título. Mas para a gente valeu pela forma como foi, para mim isso é o mais importante.
E as inspirações do Roger em 2015, onde dá para chegar?
Continuar evoluindo, dividindo e compartilhando ideias, que é a base do conhecimento. Continuar elevando o nível do meu jogador, do meu atleta. Costumo dizer que, por vezes, os jogadores brasileiros são uma Ferrari engatada em segunda. Me sinto responsável por elevar o nível do meu jogador no dia a dia. E continuar nesta evolução que o time está, com segurança, mas entendo que, se hoje nos observam mais, temos que trabalhar mais.
Roger gostou mesmo foi da atuação no Gre-Nal (Foto: Lucas Uebel/Grêmio FBPA)
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O humor de Roger anda muito bom. Também pudera. A última semana foi próxima da perfeição para o treinador. Seu Grêmio se tornou uma das sensações do Brasil ao golear o Inter num Gre-Nal histórico de 5 a 0 e depois bater o Atlético-MG, até então líder e uma das melhores equipes do país, com direito a gol em contra-ataque que assombrou o mundo. O técnico recebeu o GloboEsporte.com para uma conversa no campo do CT Luiz Carvalho, na manhã deste sábado, esbanjando alegria e com uma cuia de chimarrão em punho para uma rápida entrevista - ou aula? - sobre futebol.
Iria depois para a concentração, onde costuma assistir de dois a três jogos do futebol mundial - o detalhe é que prefere acelerar a velocidade da imagem em duas vezes. Anota uma parte em uma caderneta, enquanto deixa outras informações guardadas na memória, para que se englobem com seus conhecimentos e possam virar jogadas específicas, como os belos gols marcados no Mineirão. Didático, Roger sempre explica tudo o que quer para os jogadores antes dos treinamentos. O mesmo ocorreu durante a entrevista, quando ampliou suas teorias e falou sobre sua preparação no meio acadêmico para conseguir uma chance. Que ele pareceu aproveitar como poucos profissionais.
Afinal, o Grêmio é terceiro colocado do Brasileirão, com 33 pontos, atrás apenas de Atlético-MG e Corinthians. Nada mal para quem iniciou a competição desacreditado e contratou o novato de 40 anos há três meses, precisando substituir um ídolo do clube, Felipão, demitido após não conseguir tirar mais de seu elenco. Antes mesmo do atual bom momento, tivera início promissor, com direito a cinco vitórias seguidas - depois, oscilou. Até voltar a chamar de vez a atenção do Brasil, com sete gols em dois jogos.
- Receber a oportunidade. Vejo como um ciclo. É um processo, de períodos em períodos. O que nós treinadores mais jovens temos que fazer é continuar nos capacitando, para que, quando as oportunidades apareçam, a gente consiga aproveitá-las para ganhar espaço neste restrito mundo - destacou Roger, otimista com o Brasil: - Nossa forma de jogar está retornando a raiz do nosso futebol: que é ter a posse, mantê-la para mim, criar movimentos dentro do jogo através da troca de passes, para permitir que nossos jogadores de lado de campo, que tenham vitória pessoal, sejam colocados em condições de um para um, cheguem através da vitória pessoal no terço final do campo com bastante gente na área. É o que tem me deixado animado, tenho visto cada vez mais isso.
O treinador ainda discorreu sobre os métodos de trabalho diário e a sua relação com a academia - é formado em Educação Física pela Sogipa, em Porto Alegre. E deixou claro que está sempre atento a novos elementos para arquitetar treinos. Por exemplo, o centroavante Braian Rodríguez, com um chute no gol, o incentivou a criar um trabalho diferente.
- Costumo dizer que, por vezes, os jogadores brasileiros são uma Ferrari engatada em segunda. Me sinto responsável por elevar o nível do meu jogador no dia a dia.
De chuteiras brancas, senhoras e senhores, Roger Machado.
Confira a entrevista:
GloboEsporte.com: Como ocorreu o início da sua carreira e a sua escolha por ser treinador?
Roger: Vou começar pelo fim da carreira de jogador. Eu tinha como planejamento jogar até os 35 anos. No final de 2008, por um problema na coluna, eu decidi encerrar a carreira. Me recuperei, fiz um contrato com o DC United, dos Estados Unidos, mas não passei da pré-temporada, porque tive outra crise de hérnia de disco. Mas, antes disso, já havia feito vestibular e trancado a matrícula para um eventual retrocesso, o que aconteceu. Antes de parar, já havia identificado que, primeiro, queria ser treinador de futebol. Mas, entendia que tinha que me desligar completamente da figura de jogador, passar um tempo na minha cidade natal, com minha família, e me capacitar para ter um diferencial competitivo nesta outra carreira. Fui buscar na faculdade de educação física os elementos que hoje norteiam o meu trabalho.
Depois veio o Grêmio, como auxiliar...
Dois anos à frente, fui chamado para ser o auxiliar da comissão permanente do clube, que estava sabendo formada. Neste meio tempo, fiz um curso de gestão esportiva, para entender um pouco mais, de forma mais ampla, não só questões do campo. Nestes três anos como auxiliar técnico, assumi o time como treinador auxiliar ou por concomitância de duas competições e o treinador principal estar na Libertadores, ou pela ausência dos treinadores motivada pelas saídas destes. No final de 2013, já formado em Educação Física, entendia que tinha que cumprir a última etapa e ser treinador principal de uma equipe. Entendia que tinha que ter essas experiências fora do clube, em outro ambiente. Pedi a saída para em janeiro de 2014 assumir como treinador do Juventude.
Ou seja, virou técnico de futebol...
Assumi no Regional, fiz o campeonato, levamos até a fase que fomos eliminados pelo próprio Grêmio, fiz metade da Série C e saí, depois de duas derrotas em casa, estando invicto até então, em terceiro lugar no campeonato. Fiz um período de observação e estágio na Itália, com o Roberto, meu auxiliar. Além de observação de treinamentos do Chievo, por convite de um amigo que ia fazer, o Adaílton, que jogou muito tempo lá. Como o futebol dá uma rede de relacionamentos, através dos amigos… através do Thiago Silva, fui ver Olympique de Marselha em Paris. Mandei uma mensagem para o Marcelo e ele traz dois ingressos para Real Madrid e Barcelona. Falo com um amigo na Inglaterra para conseguir ingresso para ver Crystal Palace e Sunderland, aí compra outros… Durante 33 dias, além da semana de observação, que foi preciosa para mim no Chievo, vi 9 ou 10 jogos. Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Itália... Fui ver o 7 a 1 de Roma e Bayern. Peguei jogos bons. Fiz questão de escolher jogos de diferentes níveis, culturas. Time grande contra grande, médio contra médio, pequeno contra pequeno. Para ter uma amostragem maior, ver semelhanças e diferenças neste ambiente. Voltei e no final de dezembro, acertei com o Novo Hamburgo para fazer o Regional. Fomos até depois da fase classificatória, nos deparamos com o Grêmio e saímos nas penalidades. Fiquei aguardando a movimentação do mercado, esperando a oportunidade. E veio de onde eu menos esperava naquele momento, pelo estágio que eu estava na carreira. Nas entrevistas que dei quando saí em 2013, disse que, a partir daquele momento, o que me movia era fazer bons trabalhos para ser lembrado.
E foi lembrado.
E fui. Felizmente, cá estou eu.
O que mais o moldou, nesta caminhada, no treinador que você é hoje? Tem algum ponto especial?
Tive 17 anos como jogador de futebol no alto nível. Tive mais de 30 treinadores. Sem dúvida aprendi com todos. Algumas coisas, seja o modo de dar o treinamento, o de dar uma palestra, gerenciar o grupo, fazer um intervalo, administrar torcida, diretor, imprensa. Com todos, tive a felicidade de vivenciar e aprender alguma coisa. Sempre fui observador nisso. Minha construção começa desde a minha carreira de futebol. Claro que tu tem a tua personalidade e absorve, e dentro dos teus traços, monta teu perfil. A faculdade de educação física talvez tenha sido um divisor nesta construção porque me permitiu abrir a mente e a cabeça para algo que constantemente está em adaptação, evolução. Os processos metodológicos e conceituais. Toda hora há algo novo sendo feito. A faculdade me permitiu desfrutar de tudo isso, receber um conhecimento que me permite administrar e mensurar minha sessão de treinamento, periodizar meu treino e minha fase no calendário, com preparador físico. Entender um pouco de fisiologia, para saber qual via metabólica estou usando na sessão de treino. Mensurar as cargas de trabalho. Entender um pouquinho de psicologia do esporte e gestão de grupo, que uso muito no dia a dia. E o ambiente acadêmico por si só me permite arejar a mente. Na minha turma, era o aluno mais velho. E, quando convive com pessoas mais jovens, isso deixa a cabeça aberta para muitas coisas.
Roger durante entrevista (Foto: Montagem em fotos de Eduardo Moura/GloboEsporte.com)
O que você consome como treinador do futebol. Assiste aos jogos de fora, lê… qual a rotina do Roger?
Na concentração, há dois momentos. O da construção da palestra e depois há um tempo que você fica disponível para outras coisas. Peço para o pessoal do nosso centro de análise do clube baixar jogos de ligas que julgo sejam importantes, mesmo que não sejam as ligas principais. . Gosto de procurar na internet, tenho uma biblioteca razoável com livros de diferentes pontos de vista, relacionados a grandes times formados, movimentações, esquemas táticos. Livros de análises estatísticas, de ligas diferentes, para ter uma amostragem e saber se os números daqui são diferentes dos de lá. E na verdade não há muita diferença. E assistir aos jogos. E tenho facilidade de enxergar. Vejo melhor quando acelero o jogo, duas vezes. Um jogo, vejo em um tempo. Por isso, vejo mais jogos. Aproveito muito daquilo, muita coisa que percebe de comportamento que é treinada. Mas alguns momentos do jogo que é a questão da tomada de decisão e improviso do jogador, que gera uma movimentação interessante. E que pode ser o princípio ou a raiz de um treinamento que você pode utilizar, porque a movimentação aconteceu pela inteligência esportiva do jogador, pela movimentação que pode ter sido aleatória, mas que abriu espaço e foi utilizado por um terceiro jogador. Guardo tudo isso para montar minha sessão de treino, idealizar o que quero e quero que esses comportamentos sejam vistos pelos jogadores.
Anota as análises ou fica na cabeça?
Muita coisa eu anoto, registro em uma caderneta de papel, em um livreto que tenho de anotações. Mas muita coisa fica guardada na cabeça, até faço questão que fique registrado na memória, na cabeça. Que fica com outras informações, que ficam conectadas, e isso faz bem para a construção das minhas ideias.
A frase na qual você se coloca como um "vendedor de ideias" não é uma novidade. Qual as ideias que você mais vendeu aqui no Grêmio?
Para mim os dois pilares principais da construção do meu trabalho é a questão do treinamento simular o jogo, em 100% do treino. Conscientizá-los que só vai jogar com intensidade se treinar com intensidade. E que o que você repete aqui vai para o jogo. Não memoriza um gesto técnico errado, repetindo no treino muitas vezes, porque você vai levar para o jogo. Treinar a concentração na atividade é muito importante. Quando se treina concentrado, o cérebro registra com mais facilidade. Não vou ficar duas horas no campo, mas vai ser uma hora com muita intensidade. Se não for intenso, não vai se condicionar. Prezo quase 100% do tempo de bola. O Rogerinho (Rogério Dias, preparador físico) trabalha também, mas se baseia muito na questão do meu trabalho, para elevar a questão da capacidade física. Se for 10 ou 20 minutos de atividade, se for intenso, vai se condicionar. Se for de forma mais lenta, não condiciona. E a questão da gestão de grupo, de conscientização que esta profissão que a gente exerce, que eu exerci, que futebol é mais que chutar uma bola. Preciso que meu jogador seja inteligente do ponto de vista esportivo para entender o que acontece no jogo. Dentro de campo a gente é o último elo da corrente, a ponta do iceberg. A parte visível do processo. Há uma estrutura e uma equipe por trás. Que é muito grande e por trás da estrutura, ainda tem 10 milhões de torcedores. Que, na verdade, é uma responsabilidade muito grande. Quando a gente consegue se permitir entender que é parte de algo maior, para mim, valoriza muito mais as coisas que acontecem no jogo.
Os gols do Mineirão foram muito falados nos últimos dias. A gente viu as imagens do treino de quarta e claramente aquilo foi treinado (veja no vídeo abaixo). Veio da observação do rival? Como é a construção das jogadas que vão para o campo?
Muito do que falei, de observação de outros jogos. Por vezes é alguma coisa construída no treinamento, mas por vezes aconteceu alguma jogada pela inteligência de um jogador, a linha estava alta e eu ver: "olha, essa bola entrou". Posso transformar isso em uma jogada, em um treino, que possa sistematizar isso. E gera um comportamento que vai para o jogo. Por que trabalhar na véspera do jogo este tipo de situação? Porque quero trabalhar com a memória de curto prazo do atleta. Vai estar guardado. Falo para fazer com concentração e atenção, que vai estar registrado. No momento certo, tu vais reagir àquela situação que foi vivenciada no treinamento. E claro muito da literatura que eu leio de outras culturas, que tem no sistema tático, no trabalho tático, uma questão muito importante. Me dá elementos. Meu próprio treino, quando acontece uma movimentação pela inteligência de deslocamento ou tomada de decisão do meu jogador, é um elemento para eu construir uma outra atividade em cima daquilo e que me dê situações.
Teve um treino que eu preparei e tinham duas goleiras que seriam da próxima atividade. Era uma posse e as goleiras estavam preparadas para a próxima. E o Braian entendeu diferente, roubou a bola e finalizou. E eu disse: "Ô, Braian, acho que tu me deu um treino". Pode deixar que vou dar autoria, vai ter o "treino Braian" (risos). Ele entendeu que estava ali a goleira, que era roubar e finalizar. Ficou interessante. Tudo isso, junto com várias coisas, me dão elementos.
Grêmio foi concebido sem referência, com Luan mais adiantado, porém, sem ser o cara que fica entre os zagueiros. É o diferencial do Grêmio, ou é simplista dizer isso?
A gente analisando desta forma, acaba sendo muito superficial. Porque se diz muito porque o Luan anterior à minha chegada jogava deslocado no lado do campo. Mas pouca gente sabe que o Luan era atacante, nesta função, na sua formação. Como tem a virtude de sair da área e criar os espaços, mas isso não impede que um centroavante de presença também faça. O grande exemplo a gente tinha conosco aqui até ano passado, o Barcos. Era um centroavante de área e que tinha facilidade de sair, abrindo espaços. Os comportamentos e princípios do nosso jogo, que procuramos trabalhar desde que chegamos, tem princípios que são a base do meu time: ter a bola, mantê-la comigo, porque acredito que ataco o adversário e também descanso com ela. Se eu a perco, tenho que retomar o mais rápido possível. Depois da perda, tenho pressão na bola, para induzir o adversário ou a mudar a velocidade do ataque, atrasando a jogada. Se houver o enfrentamento, ter a posse de novo. Jogar com amplitude. Da mesma forma que na minha saída de bola abro meus zagueiros, para sair, para entrar no último terço do campo tenho que ter essa amplitude. Questão da compactação: não é usar o impedimento, é usar a regra do fora de jogo a nosso favor. Encurtar o campo para o adversário jogar e por consequência ter mais jogadores perto da bola, para roubar ou trabalhar ela. Esses princípios todos, diariamente, a gente constrói através dos trabalhos. O resultado vai para o jogo.
Roger usa barreira metálica em treino (Foto: Lucas Uebel/Grêmio)
O Douglas é um caso à parte na sua equipe? Ele ficou mais perto do gol, com uma faixa menor para se desgastar e apresentar a qualidade?
O que digo por vezes é que a bola não precisa passar a todo momento pelo meu articulador. Não precisa ser o centralizador. A capacidade e habilidade do meia, que tem a habilidade de fazer o time andar com a bola, dá tempo do meu time sair, me dá uma jogada semifinal, assim como foi contra o Atlético-MG, tenho uma jogada final também. O que em alguns momentos, talvez tenha alterado no posicionamento, foi ele solicitar que, cada vez menos, viesse perto da linha dos meus jogadores médios, para articular o time. Para que permitisse que esses jogadores que tem por característica boa saída de jogo, sejam articuladores, e ele procure uma posição adiantada, e entre as linhas, poder usar sua capacidade. No terço final do campo, pela linha de lado, ou perto da área, que seja um jogador mais próximo da área. Que o volante se adianta e que se necessário for, tenha nos meus zagueiros articuladores da jogada. Para que eu tenha mais jogadores à frente da linha da bola, e por consequência, linhas de passes e mantenha a bola sobre o meu controle.
Você tem uma linguagem muito característica. Podemos ver os termos terço final do campo, amplitude, enfim... Já teve algum problema de passar a mensagem com jogadores?
Se ele não entender, eu uso outra linguagem (risos). É só questão de costume, de hábito, porque a linguagem é da literatura que eu leio. Vem daí. Vem dos portugueses, que escrevem muito e muitos livros holandeses, alemães, ingleses, são traduzidos para o português de Portugal. Talvez venha desta literatura. Mas não tive problema. Quando tem, eles perguntam de novo.
Roger vê "ciclo natural" para técnicos emergentes aparecerem no mercado (Foto: Reprodução)
Que dificuldade se encontra em começar a trabalhar no Brasil. Por exemplo, você, o Eduardo Baptista, técnicos emergentes, qual a principal dificuldade para aparecer no mercado?
Receber a oportunidade. Vejo como um ciclo. É um processo, de períodos em períodos. Foi assim com os treinadores na década de 70, que hoje são renomados. Acontece de tempos em tempos, há uma janela no processo, e neste momento, estamos dividindo este espaço com treinadores que têm uma história e um trabalho oferecido de grande valia, e uma geração entrando. É o processo natural. Aos poucos, isso vai acontecendo. O que nós treinadores mais jovens temos que fazer é continuar nos capacitando, para que, quando as oportunidades apareçam, a gente consiga aproveitá-las para ganhar espaço neste restrito mundo. O universo do futebol é restrito. São 20 times da Série A, 20 na Série B, 20 na Série C, 40 na D, talvez. São 100 profissionais para disputar vaga no mercado. É apertado o funil. Mais do que para jogador, que cada time tem 30, 35 no grupo.
E o futebol brasileiro? Qual sua avaliação e como está vendo o Brasileirão, por exemplo?
Nós, durante bastante tempo, exportamos muitos jogadores. E continuamos. Temos muitos jogadores lá fora. Temos, hoje, no futebol brasileiro, muitos jovens começando. Muitos jogadores retornando, depois de 10, 15 anos fora. E um núcleo de jogadores entre 25 e 28 anos. Uma variedade grande, equilíbrio grande de experiência nos times. Muitos jovens e jogadores vividos. Dá um elemento diferente. O jogo se torna mais rápido. Com a vivência, a globalização, é um jogo mais tático. E por consequência com melhor qualidade. Tanto do ponto de vista comercial como do público, um jogo que se torna mais agradável. Entendo que vai continuar evoluindo quando a gente ajustar o calendário. É o ponto de partida para o restante das questões.
Do ponto de vista do futebol, vejo com bastante satisfação. Estamos voltando nosso olhar para dentro do nosso futebol. Temos que ter o intercâmbio, ir lá fora buscar essa experiência, mas nós temos o nosso jeito de jogar. Temos nosso estilo. Estamos evoluindo do ponto de vista de metodologias mais atuais, mais modernas, que fez um jogador mais forte, mais rápido, mais resistente. Mas do nosso jogo, você vê jogadores abertos, como tínhamos um ponta esquerda. Fomentar o meia que pisa na área, que foram muitos nesta forma, Zico, Pelé jogou ali, Rivellino. Jogadores que tinham habilidade e chegavam no terço final do campo, na área, para serem decisivos. Nossa forma de jogar está retornando a raiz do nosso futebol: que é ter a posse, mantê-la para mim, criar movimentos dentro do jogo através da troca de passes, para permitir que nossos jogadores de lado de campo, que tenham vitória pessoal, sejam colocados em condições de um para um, cheguem através da vitória pessoal no terço final do campo com bastante gente na área. É o que tem me deixado animado, tenho visto cada vez mais isso.
Como se sentiu com o resultado histórico do Gre-Nal? Entre as torcidas, houve discussão sobre a repercussão da goleada, com colorados rebatendo falando de títulos...
Se o Gre-Nal tivesse acabado 1 a 0, da forma como construímos o placar, estaria muito satisfeito. É um placar atípico, tão atípico que foi há muito tempo atrás o último. Foi motivado pela circunstância do jogo. O torcedor claro que considera um título. Mas para a gente valeu pela forma como foi, para mim isso é o mais importante.
E as inspirações do Roger em 2015, onde dá para chegar?
Continuar evoluindo, dividindo e compartilhando ideias, que é a base do conhecimento. Continuar elevando o nível do meu jogador, do meu atleta. Costumo dizer que, por vezes, os jogadores brasileiros são uma Ferrari engatada em segunda. Me sinto responsável por elevar o nível do meu jogador no dia a dia. E continuar nesta evolução que o time está, com segurança, mas entendo que, se hoje nos observam mais, temos que trabalhar mais.
Roger gostou mesmo foi da atuação no Gre-Nal (Foto: Lucas Uebel/Grêmio FBPA)
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